Cigarro eletrônico cresce e preocupa governos de MT

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Da Redação

A indústria do tabaco está ciente de que a tendência é de queda ou estabilidade do número de fumantes. Por isso, a aposta são novos dispositivos eletrônicos de fumar, com alto apelo entre os jovens.

Parecido com um pendrive e recarregável via USB, o vaporizador Juul, lançado há três anos, caiu nas graças dos adolescentes e virou uma dor de cabeça para a FDA (agência reguladora dos EUA).

Recentemente, o órgão anunciou o novo Plano de Prevenção de Tabaco na Juventude por causa do dispositivo, que já corresponde a 60% do mercado de cigarros eletrônicos naquele país.

A entidade encontra-se em um dilema: diz que vê a possibilidade de cigarros eletrônicos oferecerem uma alternativa menos danosa a adultos fumantes que querem obter a nicotina sem os efeitos maléficos da combustão de tabaco, mas, ao mesmo tempo, precisa proteger os mais jovens.

Por isso, já deixou clara a intenção de aplicar multas e sanções caso detecte direcionamento publicitário desses produtos aos mais jovens.

Em países da Europa, no Canadá, no Japão e na Coreia, formas alternativas de fumar também ganham espaço.

No Brasil, elas permanecem proibidas pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Não é difícil, porém, adquirir dispositivos sem marca ou garantia de origem em sites ou em lojas de produtos importados e tabacarias.

Os dispositivos mais comuns dessa nova onda dos cigarros são os vaporizadores, categoria do Juul. Em vez de queimar tabaco, um líquido (“juice”) vira vapor. O líquido fica à escolha do fumante e pode ou não conter nicotina.

Outra modalidade mais nova são os produtos de tabaco aquecido, que, como indica o nome, aquecem um cartucho de tabaco e liberam vapor, sem queimá-lo.

A nicotina é a substância que vicia e que dá prazer aos consumidores de tabaco, mas ela não causa câncer.

Os “vapers” (vaporizadores) podem custar de R$ 40 a R$ 800. Os “juices”, que têm sabores sortidos (inclusive de cigarro, maconha, sorvete de flocos e frutas), custam entre R$ 10 e R$ 30 cada 10 ml.

A Anvisa afirma que tem combatido o comércio ilegal, em parceria com órgãos sanitários locais. Segundo a agência, 428 sites ou propaganda foram retirados do ar em 2017.

Em meio à pressão da indústria, a agência já declara avaliar a possibilidade de mudança na regulamentação. Segundo a reportagem apurou, porém, a discussão não deve ter conclusão tão cedo. Há resistência de técnicos e de diretores e faltam dados sobre os riscos do consumo a longo prazo.

“Os estudos que existem mostraram que não são produtos inócuos. Certamente, as indústrias fazem estas afirmações por conta do interesse em vendê-los no Brasil”, disse a agência em nota.

O principal argumento a favor da regulamentação e liberação da venda dos produtos é o da segurança, argumentam as indústrias. No mercado ilegal, não é possível saber quais substâncias os cigarros eletrônicos contêm.

Do outro lado, entidades médicas e antitabagistas apontam riscos de aumentar o consumo entre crianças e adolescentes e a falta de informações sobre os malefícios a longo prazo. A Associação Médica Brasileira e a Sociedade Brasileira de Oncologia, por exemplo, pediram que a proibição seja mantida.

Há também questões de segurança a observar. O dispositivo pode superaquecer e explodir e/ou liberar substâncias nocivas. Outro possível risco é exagerar na dose de nicotina, especialmente quando não há padronização dos líquidos e dos equipamentos.

O cálculo do risco final para o consumidor de produtos à base de tabaco pode ser dividido em duas etapas.

A primeira depende das emissões de substâncias tóxicas. Para a indústria, está aí o trunfo dos cigarros eletrônicos: mesmo com a nicotina, o nível de substâncias tóxicas sem combustão e fumaça cai entre 90% e 95%.

Mas ainda há uma incógnita na segunda etapa, a de exposição: não se sabe se, na prática, um usuário que tenha substituído o cigarro convencional pelo eletrônico vai fumar mais graças à aceitação social, por exemplo.

Sem dados de pelo menos dez anos, não é possível afirmar categoricamente que os cigarros eletrônicos geram menos risco. Isso impede a obtenção de registro como potenciais redutores de danos em diversos países.

A British American Tobacco, da qual a Souza Cruz é subsidiária, diz que planeja um estudo clínico no Japão para investigar se a transição para o cigarro eletrônico melhora a qualidade de vida do usuário -se ele passa a ter mais fôlego ou tossir menos, por exemplo.

Desde 2016, a FDA tem colocado os pedidos de registro de cigarros eletrônicos em banho-maria por falta de estudos que atestem o benefício de substituir os produtos tradicionais pelos novos.

No encontro anual da ONG Food and Drug Law Institute, que aconteceu no mês passado em Washington e do qual participaram FDA, ONGs antitabagistas, advogados e membros da indústria, uma das discussões foi o suposto potencial benéfico para quem quer parar de fumar versus o potencial atrativo para os jovens.

Para Carrie Wade, da ONG RStreet, a situação já chegou no fundo do poço. “Muitos adolescentes vão experimentar o cigarro de qualquer jeito. Se for por um dispositivo que faça menos mal, melhor”, diz ela, que atua com redução de danos no uso de opioides.

Para Matt Myers, da ONG Tobacco Free Kids, no entanto, essa movimentação não passa de um meio de a indústria manter sua clientela. “Se as empresas brigam com as políticas públicas atuais [como advertências na embalagem], quem vai acreditar que elas realmente têm redução de danos como prioridade?”

Analúcia Saraiva, gerente de relações científicas da Souza Cruz, diz que o Brasil já tem baixo índice de fumantes -10,1%, menos que a Islândia ou que o Reino Unido.

“Pode ser que algumas pessoas simplesmente não queiram parar de fumar.” Nesse caso, diz ela, o caminho é o de redução de danos. “Isso inclui menos impostos, o que faz com que esses produtos tenham maior penetração entre os que têm baixa renda, que são a maior parte dos fumantes”, diz.

Por outro lado, a política de preço único e de impostos altos ao cigarro no Brasil tem sido apontada como um dos principais fatores que levaram à redução no número de fumantes nos últimos anos.

“Nossa posição é de que quem fuma deve parar e quem não fuma não deve começar. Mas, para quem quer continuar fumando, deve ser dado o direito a essas alternativas menos danosas”, diz Fernando Vieira, diretor de assuntos corporativos da Philip Morris, empresa que declarou recentemente que pretende um dia deixar de vender cigarros tradicionais para trocá-los pelo modelo eletrônico.

A empresa sente que não há segurança jurídica para submeter pedidos de aprovação à Anvisa de seus dispositivos já vendidos fora do país, diz. Para ele, as regras atuais protegem o cigarro convencional.

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