As esculturas de cimento que chegam a ter mais de 12 metros de altura chamam atenção de quem passa pela Rua Barão de Melgaço, uma das principais vias do Centro de Cuiabá.
Os “gigantes de cimento” são produzidos pelo artista plástico Amâncio Ribeiro, de 69 anos. A Capital foi escolhida a dedo por ele após passar um período exilado na Espanha, durante a Ditadura Militar.
A pintura foi proposital. Amâncio já sabia que estava sendo procurado pelos militares desde os 16 anos. Quando ficou sabendo de uma emboscada, que tinha como objetivo capturá-lo, foi até o local propositalmente e se entregou. Antes disso, passou alguns anos viajando e se escondendo em capitais brasileiras, como Rio de Janeiro e Salvador.
Ele afirma ter sido o único pintor a fazer parte na lista de procurados da Delegacia de Ordem Política e Social (Dops) durante o regime militar em meados de 1956, por conta das fortes críticas que estampava em suas telas. A mais grave delas foi o retrato de um coronel usando uma calcinha fio dental.
A pintura foi proposital. Amâncio já sabia que estava sendo procurado pelos militares desde os 16 anos. Quando ficou sabendo de uma emboscada, que tinha como objetivo capturá-lo, foi até o local propositalmente e se entregou. Antes disso, passou alguns anos viajando e se escondendo em capitais brasileiras, como Rio de Janeiro e Salvador.
“Não estou indo embora é você quem está ficando”, foi a resposta que o artista plástico se recorda de ter dado a um soldado que se aproximou para elogiar os trabalhos dele e afirmou que ele deveria ter permanecido “na linha” para não ser expulso do país.
“Nos tiraram do avião para tomarmos banho com as mangueiras de caminhões do Corpo de Bombeiros. Homens e mulheres todos pelados, tomavámos banho juntos. As mulheres nuas, algumas menstruadas. Era uma situação”, contou.
Em 1999, após o fim do militarismo, o artista plástico, que é natural de Itabuna (BA), decidiu que queria conhecer o Brasil.
“Comprei um carro via Mercosul e pensei: ‘Vou conhecer o Brasil’. Fiquei seis meses viajando pelo país e voltei para a Europa, me divorciei, tive dois filhos [que moram na Espanha atualmente] e decidi mudar de vez, mas não queria voltar para a Bahia. Queria ficar só ou criar uma nova família. Queria uma novidade, sempre fui assim”, contou.
A notícia da viagem para a capital de Mato Grosso não foi recebida com bons olhos por amigos e familiares. Naquela época, Cuiabá ainda era um município pouco desenvolvido em termos de recursos. “Terra de pistoleiros” foi uma das justificativas que um dos contrários à mudança utilizou para que Amâncio não tomasse a decisão.
“Imaginava Cuiabá como um lugar pequeno e era isso que queria. Decidi que se não queriam que me mudassem para cá, era exatamente isso que faria”, brincou.
Em meio às tratativas para comprar um espaço na Capital, Amâncio disseter sido convidado para fazer a abertura de uma exposição com Yoko Ono, em Brasília. Ela é uma das muitas personalidades que o artista plástico disse ter conhecido.
O ex-presidente Lula, os cantores Gilberto Gil, Caetano Veloso, Alceu Valença e Dominguinhos são alguns dos nomes que endossam a lista de “conhecidos” do artista plástico. Orgulhoso, ele mostra um retrato de uma roda de violão em um sítio.
No centro da imagem, o compositor de “Anunciação” aparece tocando o instrumento.
Apressado para mostrar outras “relíquias”, Amâncio vai até os fundos do ateliê e volta com um chapéu nas mãos. O acessório, segundo ele, pertenceu ao cantor e sanfoneiro Dominguinhos, que, em uma passagem por Cuiabá, fez questão de ir até o local.
O artista plástico exibiu, minuciosamente, os detalhes do acessório costurado a mão e com características típicas do nordeste, durante a conversa com a reportagem.
“Todo mundo que vem aqui quer colocar na cabeça”, brincou.
“No exílio, eram os sindicalistas que mais apoiavam os exilados. Durante os anos de exílio vivi apenas da minha arte, assim como em toda a minha vida. Nunca tive outra profissão a não ser fazer arte. Então, nós conversavámos, saíamos juntos algumas vezes. Cheguei a conhecer e falar com o Lula, com Gil e Caetano”, disse.
Por telefone, ele formalizou e adquiriu a compra do galpão na Rua Barão de Melgaço – de onde não saiu mais. Ele também contou ter comprado uma livraria no Centro de Cuiabá, já que também estava em busca de investimentos.
Alguns meses depois, Amâncio, contrariando todas os conselhos recebidos, se mudou para Cuiabá.
Fonte: Midia News