“Precisamos assumir que o que está acontecendo no mundo é a misoginia e o ódio contra as mulheres”, afirma ministra Cida Gonçalves

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Responsável pela pasta das Mulheres, ministra foi entrevistada nesta sexta-feira (15) no programa Giro Social. O G20 Social antecede a Cúpula dos Chefes de Estado do G20, no Rio de Janeiro, e prossegue até sábado (16)

Aministra das Mulheres, Cida Gonçalves, enfatizou a importância das contribuições das mulheres no G20 Social e fez uma convocação: “precisamos assumir que o que está acontecendo no mundo é a misoginia e o ódio contra as mulheres”. De acordo com Cida, nas documentações construídas pelo Grupo de Trabalho Empoderamento de Mulheres, a questão da autonomia econômica foi tratada como uma das prioridades para que mulheres possam sair da situação de violência, ter autonomia, definir o que fazer e ter o direito de ir e vir.

As afirmações e posições foram destacadas pela ministra das Mulheres, nesta sexta-feira, 15 de novembro, em participação no programa Giro Social. Cida ressaltou ainda a importância das contribuições das mulheres no Women20 (W20) e no G20 Social. “Os países que compõem o G20 fizeram o debate e trabalharam a questão da misoginia como um processo muito forte em todos os países e que traz recortes de raça, de etnia, que cada país contém e o nosso contém todos”, acrescentou.

O objetivo do G20 Social, que ocorre no Rio de Janeiro e prossegue até sábado (16), é ampliar a participação de atores não-governamentais nas atividades e nos processos decisórios do G20, que durante a presidência brasileira tem por lema “Construindo um Mundo Justo e um Planeta Sustentável”.

Apresentado por Karine Melo, jornalista e apresentadora da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), o Giro Social contou com a participação de jornalistas convidados, que indagaram diversas questões relativas ao G20 Social e à ministra Cida Gonçalves. Acompanhe os principais pontos da entrevista:

EMPODERAMENTO DAS MULHERES — Precisamos primeiro assumir que o que está acontecendo no mundo é a misoginia e o ódio contra as mulheres. Eu acho que o documento do G20, de empoderamento das mulheres, traz isso com muita força. Os 19 países que compõem o G20, que fizeram o debate, trabalharam essa questão da misoginia como um processo muito forte em todos os países. E trazendo os recortes necessários de raça, de etnia, que cada país contém e o nosso contém todos eles.

MULHERES NEGRAS — As mulheres negras no Brasil são as que mais morrem. São 62% das mulheres que sofrem feminicídio são vítimas de violência. Então, você tem um recorte muito forte que faz parte do racismo que está colocado também no mundo.

AUTONOMIA ECONÔMICA DAS MULHERES — A autonomia econômica é um fator primordial e primeiro para a mulher poder sair da situação de violência, ter a sua autonomia, definir o que fazer, o direito de ir e vir. Isso é fundamental. E é por isso que, no documento do G20, nós tratamos a questão da autonomia econômica como uma das prioridades. E, tratando dentro da perspectiva de que ela tenha que ter o trabalho. Que o salário seja igual ao do homem, trabalho igual. Nós temos esse desafio ainda no mundo inteiro, mesmo na Alemanha, que também já tem a lei da igualdade salarial, nós ainda temos uma diferença que está colocada igual no Brasil. Então, isso é um problema do mundo. E tem também a questão de acreditar que as mulheres podem ser empreendedoras, que elas podem estar onde elas quiserem.

MULHERES NAS CIÊNCIAS EXATAS — Temos outro desafio, que é colocar as mulheres nos espaços principalmente de exatas, da ciência e tecnologia, da matemática, da física, da química, porque as mulheres ainda estão nos lugares da questão humana e isso tem sido o potencial para colocar elas com salários desiguais.

POLÍTICA NACIONAL DE CUIDADOS — O texto, o que foi aprovado, o projeto de lei que o governo mandou, que o presidente Lula encaminhou para a Câmara dos Deputados, na nossa avaliação é um grande avanço. Nós temos condições, a partir daí, de ter políticas públicas. E o texto também foi acrescido da questão do Pacto Federativo e isso avança para as responsabilidades dos municípios, dos estados, sobre a política de cuidados. Teve algumas coisas que foram tiradas, mas a essência principal do projeto se manteve. E para nós, governo, ele é fundamental, porque agora nós vamos trabalhar com o plano, porque ele determina que nós precisamos ter um Plano Nacional de Cuidados.

DIVISÃO DO CUIDADO — Quais são os serviços e o que é que nós estamos pensando para que, de fato, as mulheres tenham mais tempo e como é que nós podemos fazer a divisão do cuidado? Porque também é importante, e aí eu quero vincular com a questão da autonomia econômica, que as mulheres não conseguem ter ascensão ao mundo do trabalho e o trabalho que elas conseguem é o de menor salário, exatamente porque ela é responsável pelo cuidado da família.

FEMINICÍDIO ZERO — A mobilização do Feminicídio Zero, ela é uma proposta para que o governo faça a sua parte, os governos façam a sua parte, que é implementar políticas públicas. E, para isso, nós estamos fazendo as Casas da Mulher Brasileira, os centros de referência, a Patrulha Maria da Penha e nós estamos investindo em tornozeleira eletrônica. Então, nós estamos fazendo várias ações de políticas públicas, mas nós precisamos que a sociedade se envolva.

PAPEL DOS HOMENS — A grande questão do feminicídio, da mobilização, é que a gente precisa falar com todas as pessoas. E nós não podemos mais falar só com as mulheres, nós precisamos falar com os homens. E a decisão de ir para os estádios, de ir para outros caminhos, é exatamente para que nós possamos trazer os homens para o debate da violência contra as mulheres. É fazer com que eles também se posicionem, porque nem todos os homens no Brasil são agressores, nem todos eles são feminicidas. Então, quem não é agressor precisa estar com a gente, precisa ser o nosso interlocutor, dizer para o seu amigo: “Não dá, não faz, é crime”. Tem que denunciar.

LIGUE 180 — A Central 180 voltou a ser um canal de receber denúncias, mas também é importante a questão de que o 180 passa também a dar informação, não só a receber denúncia, mas prestar informação e orientação. Quem não sabe o que fazer em uma situação de violência, tem um vizinho, tem um amigo, não sabe o que fazer, liga no 180. As atendentes estão treinadas, estão preparadas para te orientar, para dizer quais os passos, em que artigo da lei se enquadra. O que pode, o que não pode, isso é super importante. E o 180 é um canal fundamental, porque ele é um telefone gratuito, em qualquer lugar do país, agora também a nível internacional, para atender as brasileiras. Portanto, nós podemos atender as mulheres brasileiras do mundo inteiro.

INTERCÂMBIO ENTRE PAÍSES — Cada país tem uma realidade, a gente termina trocando um pouco mais a perspectiva do que é específico para cada país e que une todos os países. Então, uma das questões que a gente tem colocado é a qualificação dos profissionais, dos servidores públicos, para fazer o atendimento, não só nos serviços especializados de cada país, porque no Brasil a gente tem a Lei Maria da Penha, que inclui vários serviços, mas você tem outros países que não têm, que você só tem o Ministério Público. Cada país termina se adequando, mas o importante é que todos os serviços e todas as pessoas estejam preparadas para atender as mulheres em situação de violência.

AVANÇOS NA LEGISLAÇÃO — É um desafio que está colocado para o mundo inteiro, nós temos muita dificuldade com relação à questão das legislações no Brasil e fora do Brasil. E, portanto, a nossa Lei Maria da Penha é uma lei muito importante, ela é a terceira melhor do mundo, então, ela está servindo de inspiração para o mundo. Em compensação, a Lei do México do Feminicídio é muito mais avançada que a nossa. Temos diversas trocas que vão sendo feitas, vão sendo aperfeiçoadas nos debates do G20. De fato, são as trocas que permitem a nós, por exemplo, estar assinando um acordo de cooperação com o México para a troca de experiência, na questão da política de cuidados, da autonomia econômica e do enfrentamento à violência.

MULHERES NA POLÍTICA — O Brasil no G20, além de não ser o primeiro, não é o segundo, é o penúltimo, porque a gente tem vários países que já têm paridade. O próprio México tem mais de 54%, elas já estão chegando em 60%, por exemplo, de senadoras e deputadas. Então, os países que já têm a lei de paridade estão avançando. Está faltando isso, essa é a grande questão, nós precisamos fazer um debate no Brasil. Nós temos a Lei de Cotas que coloca 30% de cota para as mulheres, tanto para serem candidatas nos partidos, quanto de financiamento. Nós só estamos vendo avançar quando é obrigatório a paridade, portanto, é eleger, garantir a eleição de mulheres, colocar as mulheres nos espaços de poder.

DIREITOS REPRODUTIVOS E SEXUAIS — O Grupo de Trabalho discutiu toda a questão da saúde integral das mulheres, porque na pauta dos direitos sexuais e reprodutivos, muitos países ainda têm restrições. Acho que é importante a gente dizer isso. Então, nós trabalhamos dentro da perspectiva do que eram os processos de consensos. O que foi consenso? A questão de você trabalhar a saúde integral da mulher, de uma forma que ela dê conta de todo o processo de planejamento familiar, de organização familiar, da saúde reprodutiva, de todos os processos e, principalmente, da questão da maternidade.

PEC EM TRAMITAÇÃO — No Brasil, nós temos um problema que é a questão da PEC que, na verdade, para nós, é um retrocesso. Nós temos há muitos anos, desde o Código Penal, a questão de três processos que garantem a mulher o direito ao aborto legal: no caso de violência sexual, no caso de risco de vida e no caso de anencefalia — que o STF decidiu agora. E nós sabemos que precisamos avançar muito mais na perspectiva do debate sobre essa garantia de direitos. Nós não queremos avançar para legalizar o aborto, nós não queremos fazer debate, nós queremos que o que está aí seja garantido, que a gente não perca nenhum direito.

ATENDIMENTO ÀS MULHERES — Tem a contracepção de emergência que vai evitar a gravidez, vai evitar doenças sexualmente transmissíveis e elas podem fazer o acompanhamento e tratamento psicológico para essa questão da violência. Quando nós falamos em atendimento às vítimas de violência sexual, nós estamos falando desse atendimento. Nós estamos falando do apoio. É um apoio imediato. Acolhimento que a mulher precisa, exatamente no momento que ela mais não tem o que fazer. Ela tem vergonha de dizer à família, ela tem vergonha de dizer para as amigas, ela se sente suja, ela se sente mal. É no serviço de saúde que ela vai ser acolhida, não é em outro lugar. E lá ela vai ter a garantia do anonimato e todos os procedimentos para que não dê prosseguimento a esse processo. Então, quando vamos falar que precisamos avançar e investir mais no atendimento às mulheres vítimas de violência sexual, nós estamos falando de todo um atendimento preventivo para que não chegue no aborto.

 

 

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