Pandemia: qual será nosso Legado?

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Por Nilson Leitão

Dizem que crises e guerras produzem inovações, mudanças de comportamento, quebra de paradigmas. Alguns afirmam: “depois disso não seremos os mesmos”. Mas, o que de fato mudará ou precisa ser mudado no mundo pós-pandemia? Quais as efetivas mudanças na economia, na saúde pública, no ambiente de trabalho, nas famílias, nas cidades, no comportamento?

Em 2001, quando eu era Prefeito de Sinop, em Mato Grosso, reestruturamos a saúde do Município com impactos regionais, como o primeiro banco de sangue, a primeira clínica de hemodiálise, o primeiro pronto atendimento de urgência e emergência, os primeiros PSFs, a primeira e única ala de tratamento de câncer daquela região, o primeiro e único hospital público da cidade.

Em 2004, instalamos dois respiradores artificiais (hoje, equipamentos essenciais devido à pandemia). Esses equipamentos eram novidade no interior do Estado, salvaram muitas vidas e foram condicionantes para implantar as primeiras UTIs da região, composta por mais de 40 municípios. Passaram-se 16 anos dessas importantes conquistas para uma região periférica do país, estruturada com equipamentos que a maioria das cidades brasileiras não tinha e não têm.

A Saúde Pública no Brasil andou a passos lentos, em alguns casos até retrocedeu. Quase metade dos municípios brasileiros não possui UTIs nem respiradores. O que concentra a demanda em cidades-pólo e capitais, na política da “Ambulância Terapia”, como se dividisse a população em que os têm acesso e direito a atendimento, e os que não o tem.

Muitas empresas e repartições públicas não serão mais as mesmas pós-pandemia. Perceberam que terão mais resultados com as pessoas utilizando a tecnologia para produzir sem deslocar, sem lotar o transporte público ou congestionar o trânsito, sem vale refeição e sem horas extras e outros gastos

Historicamente o mundo só toma atitudes no “susto”, nas tragédias, por isso teremos um legado de avanços e mudanças de comportamento, como, por exemplo, a telemedicina, tema tão resistente durante tantos anos. Me lembro que, ainda como Deputado Federal, participei de alguns debates sobre o assunto, rejeitado por setores da saúde, de academias e entidades representativas da Saúde. Agora, com a Pandemia, rapidamente compreenderam e autorizaram sem muita discussão, muita gente fazendo consultas por videoconferência, e recebendo seu diagnóstico, um avanço e economia enorme.

Outro exemplo são os tão falados “respiradores” que eram equipamentos para poucos municípios privilegiados e se tornou um equipamento popular, com inovações e preço bem abaixo dos praticados até seis meses atrás. Onde estava o dinheiro? De repente, começaram reformas, ampliações em hospitais e unidades de saúde, construções de novos hospitais, instalações de UTIs e respiradores por todo o país, obras, compras e ações em tempo recorde.

De repente, o Brasil consegue cadastrar tantos anônimos, pessoas invisíveis, que nunca estiveram em nenhum cadastro social, como se não existissem, o sistema começou a ser humanizado devido a Pandemia.

E quanto ao home-office?  Muitas empresas e repartições públicas não serão mais as mesmas pós-pandemia. Perceberam que terão mais resultados com as pessoas utilizando a tecnologia para produzir sem deslocar, sem lotar o transporte público ou congestionar o trânsito, sem vale refeição e sem horas extras e outros gastos.

As feiras livres ampliaram as vendas através das plataformas digitais e redes sociais. Os serviços de delivery (entrega) aumentaram e estão sendo implantados em vários setores, gerando mais empregos.

Com as videoconferências, por exemplo, se evita gastos com diárias, transportes, hospedagem e alimentação de servidores e autoridades públicas, que não precisam se deslocar às vezes quilômetros de distância do interior para Capitais e Distrito Federal em busca de verbas ou reuniões de trabalho. Imagine mais de cinco mil prefeitos e 26 governadores evitando deslocamentos, passagens aéreas ou locação de aeronaves? Imaginem a economia nas casas Legislativas, no Judiciário e também no Executivo. A economia com papéis, espaços físicos, energia, o cafezinho, etc. Com o aprendizado que podemos produzir igual ou até melhor sem precisar estar todos no mesmo ambiente.

Estima-se que chegaremos a 13 milhões de desempregados, claro que já tínhamos mais de 11 milhões antes da pandemia, mas é um aumento substancial para um curto período, lembrando que vínhamos numa curva de crescimento

Muitas crianças não precisarão ir para a creche, com a presença dos pais em “home-office”, economia para o serviço público e mais relacionamento familiar, tanto para os funcionários públicos e privados. A vida de muita gente vai mudar.

Nos Estados Unidos houve um levantamento de mais de 700 profissões e chegou-se à conclusão que 38% dessas profissões irão desaparecer até 2030, a inteligência artificial e a robótica podem eliminar boa parte das profissões e desses empregos, mas o nível de desemprego total não é possível prever, pois o setor de tecnologia vai gerar mais empregos com essas inovações.

Essa crise de saúde gerará, sem dúvida, uma crise econômica enorme. Teremos inúmeras empresas fechadas. No Brasil, o setor mais atingido até agora foi a indústria, depois o comércio, seguido do setor de serviços. Mais de 600 mil micros e pequenas empresas já fecharam suas portas. De acordo com o SEBRAE, estima-se que chegaremos a 13 milhões de desempregados, claro que já tínhamos mais de 11 milhões antes da pandemia, mas é um aumento substancial para um curto período, lembrando que vínhamos numa curva de crescimento.

O setor agrícola ainda é o que vem se mantendo e segurando os números positivos, mas sofrerá as consequências nos próximos meses e precisará de socorro do governo e do sistema financeiro. A economia mundial vai decrescer 1%, o mundo estará mais pobre pós-pandemia.

Deus abençoe esse novo cidadão que precisa renascer em cada um de nós todos os dias, com tantas dicas dadas nesta pandemia, o melhor legado dessa crise, estará em nossas decisões, atitudes e comportamento

O legado no comportamento das pessoas será a mudança nos detalhes, aprender a tirar o calçado na porta de casa, lavar as mãos constantemente, aprender a espirrar, mais cuidados com as mãos e máscaras farão parte da nossa vida. Seremos mais educados, mais higiênicos. Talvez menos afáveis; menos abraços e menos beijoqueiros, mas com certeza o saldo será enorme no que tange ao relacionamento familiar. Essa pandemia nos mostrou que podemos ter qualidade de tempo com a família, que somos vazios às vezes sem nossa rotina, por isso muitos se ressignificaram, se reinventaram e descobriram que tem muita coisa a fazer em família. Muitos se descobriram leitores, estudaram, cozinharam, conheceram verdadeiramente suas casas, suas intimidades, suas histórias já perdidas no porão do esquecimento por estarem ocupando suas memórias com temas alheios no WhatsApp.

Aos que fizeram da pandemia uma reorganização de vida, um reaprendizado, uma ressignificação pessoal e familiar e cuidaram da alma, corpo e mente parabéns! Aos que passaram se lamentando, brigando nas redes sociais com os que discordavam do seu posicionamento, ainda há tempo para ser mais você e menos o que você copia dos outros, para se redescobrir e dar atenção a você e aos seus. Tempo para curar nossas intolerâncias, ignorâncias, doenças e vícios mentais, sejamos melhores.

Deus abençoe esse novo cidadão que precisa renascer em cada um de nós todos os dias, com tantas dicas dadas nesta pandemia, o melhor legado dessa crise, estará em nossas decisões, atitudes e comportamento. Vamos entender que o problema do mundo está em cada “Eu”. Então, está a meu alcance ajudar a transformar o mundo para melhor.

* Nilson Leitão foi vereador e prefeito de Sinop, deputado estadual e federal por Mato Grosso e atualmente é consultor da Confederação Nacional da Agricultura (CNA). E-mail: [email protected]

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