Lideranças defendem edital para contratação de professores da Educação Indígena

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Rui Matos | Seduc-MT

Lideranças Xavante, da Terra Indígena Parabubu, localizada no município de Campinápolis, distante 553 quilômetros de Cuiabá, saíram em defesa do Edital PAS 010/2021/GS/Seduc/MT. Por intermédio do professor e líder indígena, João Gilberto Tserepopoodi Tsimiudo, da Aldeia São Domingos Sávio, caciques referendam os propósitos do edital que normatiza a contratação temporária de profissionais para a Educação Escolar Indígena para esse ano letivo em Mato Grosso.

De acordo com os indígenas, em nota oficial encaminhada ao Ministério Público da União (MPU) e à Secretaria de Estado de Educação (Seduc-MT), “as comunidades indígenas acreditam que professores com magistério e ensino superior podem contribuir para a melhoria do ensino nas comunidades, pelo fato de receberem formação específica para o ensino em sala de aula”.

Além de professor, João Gilberto Tserepopoodi também é membro do Conselho Estadual Escolar da Educação Indígena. Em Cuiabá, o professor Xavante refutou declarações feitas em nota oficial pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), na qual alega que o referido edital viola os direitos à educação escolar indígena. “Não recebemos nenhum membro do CIMI ou da Federação dos Povos e Organizações Indígenas de Mato Grosso para discutir antecipadamente ou posteriormente sobre o edital ou sobre o processo de educação em nossas aldeias”, declarou Tserepopoodi.

Segundo ele, representantes de instituições que se denominam defensoras da causa indígena deveriam participar e conhecer as rotinas e demandas do povo Xavante de Parabubu. “Só aparecer depois para criticar não contribui. A educação indígena não pode virar instrumento de emprego. Tem que contratar professores qualificados e com formação prevista no edital”, defendeu o representante dos caciques.

João Gilberto Tserepopoodi lamenta que a falta de conhecimento sobre o edital tenha provocado toda essa discussão, já que o certame foi claro quanto a qualificação dos professores que disputariam as vagas. Ele salienta que não falta professores qualificados. A Seduc já efetivou mais de 890 inscrições de professores por meio do Processo Seletivo Simplificado (PSS) destinado às vagas na Educação Indígena para esse ano letivo.

João Gilberto Tserepopoodi: “Não recebemos nenhum membro do CIMI ou da Federação dos Povos e Organizações Indígenas para discutir antecipadamente ou posteriormente sobre o edital”

Eles vão compor o quadro de professores em 70 Escolas Estaduais Indígenas distribuídas em 30 municípios de Mato Grosso. Além disso, parte desses professores também será destinada às salas anexas que funcionam em escolas estaduais regulares em outros 14 municípios de todas as regiões do estado. “Menos de 15% dos professores que buscaram o PSS não foram efetivados por não atenderem aos requisitos do processo de seleção”, afirma Lucia Aparecida dos Santos, Superintendente de Diversidades da Seduc.

“Lamentamos que o CIMI tenha disseminado pelas redes sociais notícias inverídicas a respeito do Processo Seletivo Simplificado da Educação Indígena gerando uma polêmica desnecessária”, conta Lucia dos Santos. No texto, o CIMI faz críticas ao processo de educação indígena e a desclassificação de 180 candidatos que disputavam o PPS para a função de professor.

No edital, amplamente divulgado pela Imprensa e pelo Diário Oficial do Estado, no capítulo 2, referente às funções dos candidatos, está claro que para professor (da Base Nacional Comum) exige-se nível superior com graduação em Licenciatura Plena e habilitação na disciplina de atuação, Magistério do Ensino Médio Intercultural ou Magistério do Ensino Médio. “Os candidatos que tiveram as suas inscrições indeferidas não se enquadravam em nenhumas das três opções. Portanto, o edital foi respeitado”, esclarece Lucia dos Santos.  Paralelo a isso, a Lei Complementar 50/98, a LDB 9.394/1996 e a Resolução 04/2019/CFE-MT não preveem contratação de professor ou individuo com Ensino Médio Propedêutico.

EDUCAÇÃO TRANSFORMADORA

Na nota do CIMI, fica evidente a falta de compreensão sobre a diferença entre Educação Indígena e Educação Escolar Indígena. Ambos os modelos são aplicados pela Seduc, valorizando os Saberes Tradicionais e a Base Curricular Comum, que são as disciplinas fundamentais desde a alfabetização até o Ensino Médio.

Lucia dos Santos ressalta que, diante do compromisso de promover uma educação transformadora, a Seduc não pode permitir que as leis continuem sendo violadas e muito menos que pessoas sem qualificação profissional ainda sejam atribuídas. “Desde 2003 a secretaria de Educação investe na formação e educação continuada dos professores indígenas”. Ao todo 450 professores indígena concluíram a formação em nível superior por meio de cooperação técnica e, em julho de 2022, formará mais uma turma de 120 professores. A partir de 2023, outros 120 professores terão colado grau em nível superior. No Magistério Intercultural, de 2012 a 2021, 650 professores foram diplomados e qualificados às aulas nas escolas indígenas, sem contar outros cursos ofertados desde 1996 pela Seduc.

Outra prova de respeito aos saberes indígenas e à língua materna, é o fomento que a Seduc faz na produção de livros físicos e e-books. As cartilhas didáticas foram produzidas com ajuda dos próprios indígenas em língua portuguesa e também nas línguas dos Cinta Larga, Haliti, Katiturlu, Kayabi, Manoki, Myky, Nawbikwara, Rikbaksa, Sabane, Terena e Zoro. “Não há nada semelhante em termos de comprometimento em nenhum outro estado”, compara Lucia.

PROJETO DE NUCLEAÇÃO

Ao contrário do que divulga o CIMI, das 70 escolas indígenas existentes em Mato Grosso, existe apenas uma terra indígena envolvida no Projeto de Nucleação. O projeto piloto contempla, por enquanto, apenas a comunidade indígena do município de Campinápolis. Não há qualquer vinculação direta entre a questão da habilitação e a nucleação. “Não se trata de uma situação ampla e, sim, específica”.

“Se trata de uma parceria do Estado com um único objetivo: dar ensino a juventude indígena”, define Saturnino Wapodowe

Uma nova realidade elogiada pela liderança Xavante e professor, Saturnino Wapodowe. Ele disse, representando outras 12 lideranças indígenas, que a união da Educação entre Estado e o Município de Campinápolis traz tranquilidade à comunidade indígena. O líder indígena conclui que se trata de uma parceria com um único objetivo: dar ensino a nossa juventude indigena. “Agradeço a equipe da Seduc e ao Governo de Mato Grosso por tudo que estão fazendo por nós. Essa nova geração contará com muitos ensinamentos que podem ajudar na história do nosso povo. A partir desse projeto, acreditamos que os nossos filhos poderão fazer parte do mercado de trabalho, tornando-se médicos, professores e advogados”, relatou Saturnino Wapodowe.

Pelo Projeto Nucleação, em experimento no município de Campinápolis, a escola sede fica em uma das aldeias estratégicas do ponto de vista geográfico. O objetivo é facilitar o acesso a todas as crianças de diferentes aldeias. Em uma situação inédita e por solicitação da própria comunidade.

Ocorre que houve um esvaziamento da escola e muitas destas salas anexas também foram prejudicadas pela baixa frequência de até oito alunos, não cumprindo com o seu papel pedagógico. “Também ficou impraticável para o processo de aprendizagem, reunirmos em uma mesma turma alunos do primeiro ao nono ano.  As turmas no Projeto Nucleação não são multisseriadas. As turmas são divididas em primeiro, segundo, terceiro ano e, assim, sucessivamente. Não há mistura de alunos de diferentes níveis em uma mesma turma. O projeto também não permite que as aulas sejam ministradas em estrutura física inapropriada.

Lucia salienta que, após estudo e muita discussão entre a Seduc, entes parceiros e lideranças indígenas, ficou decidido fortalecer a Escola Sede preservando apenas as salas anexas mais distantes. Em relação aos alunos das salas extintas, serão transportados em ônibus escolar e permanecerão na escola sede somente o tempo necessário para que o contato diário com as culturas tradicionais não seja interrompido.

A Secretaria de Estado da Educação seguiu o que determina a Convenção n° 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais. Qualquer decisão que possa alterar a rotina deve ser ouvida, discutida e respeitado o desejo da comunidade.

RESPEITO ÀS TRADIÇÕES

A Secretaria de Estado da educação entende que com a diversidade linguística, o processo educacional visa manter um equilíbrio, para que a língua portuguesa não seja imposta. Daí a importância do professor qualificado. “Mesmo qualificado, no caso do professor não indígena, ele ainda deve ser aceito pelas lideranças”, lembra Lucia dos Santos. Outros aspectos que devem ser assegurados são os processos próprios de aprendizagem, o desenvolvimento de currículos e programas específicos de formação continuada dos professores.

“Estamos no primeiro ano da Década Internacional das Línguas Indígenas, instituída na Assembleia Geral das Nações Unidas como resultado do Ano Internacional das Línguas Indígenas, proclamado pela UNESCO em 2019. Compreendemos nesse momento histórico a importância de uma ação efetiva e contínua em prol do reconhecimento, da valorização e da manutenção dos saberes indígenas, sem perder de vista a alfabetização comum a toda criança seja ela indígena ou não”, finaliza Lucia Aparecida dos Santos.

*Fotos: Wesley Rodrigues / Seduc-MT

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