Em processo de fritura, Guedes quer escalonar pagamentos do Renda Brasil

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Por Bernardo Caram, Daniel Carvalho e Fábio Pupo| Após crítica pública do presidente Jair Bolsonaro, o ministro Paulo Guedes (Economia) afirmou a interlocutores que pretende permanecer no cargo e vai finalizar uma proposta alternativa para o Renda Brasil, programa elaborado pelo governo para substituir o Bolsa Família.
A equipe de Guedes prepara um modelo no qual o novo benefício começaria a ser pago no ano que vem, podendo partir de R$ 220 ou R$ 230. O valor é próximo aos R$ 190 pagos hoje pelo Bolsa Famíla e inferior ao desejado por Bolsonaro, que pressiona por parcelas de ao menos R$ 300.
Como não há consenso no governo sobre os programas que seriam extintos para custear o Renda Brasil, o novo desenho de Guedes prevê que o programa comece a rodar em valor menor e os pagamentos seriam ampliados com o tempo. Isso dependeria de decisões futuras do governo e do Congresso Nacional sobre a extinção de outras ações.
Nesta quarta-feira (26), Bolsonaro disse que suspendeu a apresentação do programa social. “A proposta, como a equipe econômica apareceu para mim, não será enviada ao Parlamento, não posso tirar de pobres para dar para paupérrimos”, afirmou durante cerimônia em Ipatinga (MG).
A crítica foi vista no Planalto como uma tentativa de transferir ao ministro o desgaste de uma inevitável redução do auxílio aos mais pobres.
A colegas de ministério, Guedes reclamou da declaração, mas disse que faz parte do papel político exercido por Bolsonaro. Segundo relatos, ele ponderou que o presidente viu o efeito da afirmação, com forte turbulência no mercado e disparada do dólar.
Nos bastidores, o ministro também avalia que episódios desse tipo acabam construindo uma imagem de que o presidente é bonzinho e busca um benefício mais alto, enquanto o ministro fica como o vilão que corta benefícios.
Guedes tem sido constante alvo de ministros das alas política e militar do governo, que ficam no entorno do presidente e pressionam por ampliação de gastos públicos.
Em meio a especulações de que Guedes teria pedido demissão, o Ministério da Economia teve de soltar comunicado para desmentir o boato e afirmar que ele segue trabalhando normalmente.
O vice-presidente, Hamilton Mourão, saiu em defesa do ministro. “O Paulo Guedes tem a resiliência necessária. Essa discussão [do Renda Brasil] está sendo feita dentro do governo”, disse. “O Paulo Guedes está firme”, afirmou.”
Com a fritura criada por Bolsonaro, voltou a circular o nome do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, como possível sucessor.
Um auxiliar da família Bolsonaro disse que o nome de Campos Neto é ventilado desde a primeira crise entre o presidente e o ministro da Economia. Pessoas próximas ao chefe do BC afirmam, no entanto, que ele também poderia deixar o cargo em uma eventual demissão de Guedes.
A avaliação é de que Bolsonaro testa até onde Guedes aguenta a fritura, mas que o mais importante é encontrar alguém para apontar o dedo quando tiver de acabar com o auxílio emergencial de R$ 600, um dos principais fatores para a alta de sua popularidade.
Bolsonaro, então, conduz um jogo de morde e assopra. Na noite de terça (25), em evento com donos de bares e restaurantes, ele referiu-se à equipe econômica como maravilhosa. Menos de 24 horas depois, levou a público o embate sobre o Renda Brasil.
Um dos pontos criticados pelo presidente é o fim do abono salarial, uma espécie de 14º salário pago a quem ganha até dois salários mínimos.
“Não podemos tirar isso de 12 milhões de pessoas para dar para um Bolsa Família ou um Renda Brasil, seja lá o que for o nome”, disse o presidente.
Em reunião na terça Bolsonaro recebeu opções para o Renda Brasil e rejeitou a extinção do abono, que seria um dos programas sacrificados pela equipe econômica para reforçar o Renda Brasil. O custo anual é de R$ 18 bilhões.
Os cálculos da equipe econômica consideram que o Renda Brasil poderia chegar a R$ 270 com a extinção de 27 programas ou benefícios existentes. Se a medida incluísse o fim das deduções do Imposto de Renda, o benefício poderia superar R$ 300.
Com o veto de Bolsonaro, no entanto, as contas descem para um patamar entre R$ 220 e R$ 230, considerando a extinção de programas menores.
A partir desse cenário base, que Guedes passou a chamar de “Renda Brasil sustentável”, o Congresso poderia debater quais outros programas poderiam ser eliminados para a ampliação das parcelas.
O modelo teria sido aceito por Bolsonaro, que deu alguns dias para que a equipe econômica faça as contas e apresente uma proposta final. Segundo membros do ministério, o recado sobre não tirar recursos de pobres para dar a paupérrimos foi recebido, e serão analisadas alternativas. O desafio é encontrar espaço dentro do teto de gastos.
A opção em debate é a redução das despesas obrigatórias por peio de uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que tramita no Congresso e retira amarras do Orçamento. Mesmo assim, isso pode não abrir espaço para os recursos demandados.
Guedes diz acreditar que o anúncio do Renda Brasil pode ser feito nos próximos dias e estuda uma transição para este ano. Ele defende que o valor do auxílio emergencial caia gradualmente até atingir o patamar do Renda Brasil. Assim, seria possível ligar os dois programas.
Na terça, Bolsonaro afirmou que o auxílio emergencial será mantido até o fim do ano, mas em valor menor. “Acreditamos que teremos mais um endividamento, não na ordem de R$ 50 bilhões por mês, como é este auxílio emergencial no momento, de R$ 600, mas diminuir um pouco este valor para ver se a economia pega”, disse o presidente.
Desde domingo (23) a página do presidente no Facebook foi inundada por publicações como “Não vamos desistir! #Não aceitamos a redução do auxílio emergencial”, “Se reduzirem nosso auxílio emergencial, daremos o troco nas urnas!” e “Esse é o pedido de milhões de brasileiros! Prorrogar com R$ 600 até dezembro, neste momento, é um ato de humanidade, não político!”.
A suspensão da proposta do Renda Brasil ganhou apoio de líderes do Senado que tradicionalmente são opositores das ideias do governo. Entre eles, Simone Tebet (MDB-MS), presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).
A senadora é contra a extinção de programas sociais em prol de um único auxílio.
“Só justificaria discutir uma unificação de programas sociais se ao mesmo tempo aumentasse para R$ 300 o Renda Brasil e também pedisse uma cota de sacrifício para a cota A e B”, disse Tebet.
Da Folhapress – Brasília

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