Da redação (com informações da assessoria)
De mãos dadas ou para cima, olhos fechados e coração aberto, dezenas de dançarinos de siriri se concentram para pedir as bênçãos de São Benedito, Nossa Senhora Aparecida e São Gonçalo. A prece, feita atrás do palco, antecede a entrada dos grupos de dança que se apresentaram no 13º Festival de Siriri, no sábado (18) e domingo (19). Para além da fé e das coreografias impecáveis, uma característica comum se repetia em todos os grupos: a participação maciça dos jovens.
Sob o ritmo do mocho e do ganzá, eles levaram ao palco a certeza da continuidade da tradição, nascida da mistura de brincadeiras indígenas, com batida expressão hispano-lusitana. Resiliente, a expressão sobrevive aos séculos e ao impacto cultural causado pela intensa migração experimentada por Cuiabá, e deixando os quintais dos bairros para arrancar aplausos mundo afora.
Esta perspectiva ajuda a justificar a adesão dos mais novos à dança e estende o alcance da arte ao patamar social. “Estamos em um bairro carente onde não tinha atração, então ali se tornou um ponto de encontro para os jovens, que vinham passear dançar, e acabavam trazendo um amigo, um parente e vai juntando todo mundo em uma grande família”, conta a psicóloga Cristina de França, coordenadora do grupo Flor do Atalaia.
Dentro de cada grupo as habilidades de cada um afloram e contribuem com a construção de passos, melodias, figurinos e maquiagem, por exemplo. Sendo assim, o laço natural que participantes mais ou menos jovens mantém com a manifestação típica das festas de santo dos bailes, se estreita diante do vislumbre de novas vivências, do contato com instrumentos musicais e da descoberta de talentos.
Neste contexto, a retomada do festival pelo prefeito Emanuel Pinheiro assume papel de destaque. É o que explica o secretário de Cultura, Esporte e Turismo, Francisco Vuolo. “A partir do momento em que se organiza um evento no qual eles são os protagonistas, cria-se no íntimo de cada criança e adolescente a sensação de pertencimento a esta cultura. É uma manifestação riquíssima e que precisa de visibilidade, e é isso estamos fazendo.”
Aos 53 anos, o coordenador do grupo Flor Serrana, Almindo Reis de Oliveira, atribui à sua geração a responsabilidade de manter viva a tradição. Enquanto recobra o fôlego após a apresentação de pouco mais de 20 minutos, ele conta que o gosto pela dança surgiu quando ainda era criança e, por incentivo dos pais, levado a frente. Hoje Nézinho, como é mais conhecido, faz bonito entre participantes de 17, 15 e 12 anos, as idades dos mais jovens integrantes.
“Eu vejo aqui a continuidade de uma cultura única, que não pode morrer. As pessoas daminha faixa etária é que tem a responsabilidade de levar isso a diante. Hoje o nosso dançarino mais novo tem 12 anos, mas temos seguidores com crianças de três aninhos, já balançando a saia quando a música toca. Está no sangue. Isso é gratificante porque significa que o siriri não vai parar por aqui.”
Não se depender do dançarino Joelder Duarte, 21. “Minha família sempre participou das festas de santo, então eu tenho essa ligação. Na nossa região os moradores se reúnem no domingo e como não tem som eletrônico, o siriri agita a festa e todo mundo acaba dançando e brincando. Embora ainda tenham pessoas que achem que é coisa de velho, eu discordo totalmente. São 20 minutos de muita correria, euforia. O coração bate a cem mil por hora e isso acaba sendo o maior estímulo.”
Do lado da plateia, em frente ao telão, o discurso é endossado pelo auxiliar de serralheiro Douglas Morais, 28. “Sou cuiabano já participei de vários outros festivais, dançava também. Vejo que antigamente parece que o pessoal tinha vergonha de falar que participava. Agora eu acho que está expandindo e as pessoas mais novas estão se interessando.”
O 13º Festival também contou com exposição fotográfica temática, feira de artesanato e praça de alimentação.
Além do Flor Serrana e Flor do Atalaia, no sábado se apresentaram também São Gonçalo Beiro Rio e Coração Tradição Franciscano. No domingo, competiram os grupos Voa Tuiuiú, Tradição Coxiponé, Flor do Campo e Raízes Cuiabanas. A entrada nos três dias de festival foi gratuita.