Por Catia Seabra |A força do presidente Jair Bolsonaro será testada na disputa pela Prefeitura do Rio, seu domicílio eleitoral.
Antes disposta a afrouxar os laços com Marcelo Crivella (Republicanos) sob o argumento da neutralidade, a família Bolsonaro passou a defender abertamente a candidatura à reeleição após recente operação policial na casa e no gabinete do prefeito.
A casa de Crivella e o seu gabinete no Palácio da Cidade foram alvos de busca e apreensão na semana passada como parte da investigação sobre um suposto esquema de corrupção na prefeitura.
A operação foi recebida pela família presidencial como uma tentativa de desgaste da imagem de Bolsonaro e seus filhos –Carlos e Flávio são filiados ao partido do prefeito.
Primogênito do clã, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos) chegou a divulgar, nesta sexta-feira (18), vídeo em que lê um artigo segundo o qual “o alinhamento das atuais gestões municipal e estadual no Rio provocou uma artilharia da Rede Globo e seu canal de notícias”.
“Há um excesso de ataques de ordem pessoal e familiar. A presunção de inocência não existe “, disse.
Até então, a estratégia da família era evitar se contaminar com a rejeição sofrida pelo prefeito, que estava em 72% segundo pesquisa do Datafolha de dezembro passado.
O inquérito sobre suposto envolvimento de Crivella em esquema apelidado de “QG da propina” antecipou, porém, a explicitação de apoio a Crivella, dando sobrevida ao prefeito.
Além de Crivella, o ex-prefeito Eduardo Paes (DEM) também foi alvo de busca e apreensão dois dias antes da operação realizada na casa do prefeito.
Contra Paes, a Justiça Eleitoral aceitou denúncia do Ministério Público do Rio de que teria recebido R$ 10,8 milhões não declarados da Odebrecht para sua campanha à reeleição, em 2012.
Os abalos sofridos pelos favoritos e a falta de unidade na esquerda criaram, para os outros 12 concorrentes, a esperança de chegada ao segundo turno.
Caberá à campanha de Crivella e Paes usar o exemplo do governador afastado Wilson Witzel (PSC) –que enfrenta um processo de impeachment na Assembleia– para alertar o eleitor sobre o risco de apostar em uma novidade em plena pandemia do coronavírus.
Coordenador da campanha de Crivella à reeleição, Rodrigo Bethlem lembra, por exemplo, que as eleições se darão em um ambiente marcado pela pandemia, o que, na sua opinião, lança desconfiança sobre nomes cujo trabalho nunca foram avaliados.
Sobre o peso de Bolsonaro na eleição carioca, Bethlem afirma que “não há como fugir da nacionalização no Rio”. Ele diz ainda que Bolsonaro e Crivella têm uma amizade de muitos anos. E ressalta que o PSDB –partido do governador João Doria– é aliado de Paes.
“Paes tem Doria com ele. Isso sinaliza que Paes estará com Doria na campanha presidencial de 2022”, afirma.
Na tentativa de atrair o voto bolsonarista sem afugentar eleitores de esquerda, Paes acena a Bolsonaro com a possibilidade de uma parceria, caso seja eleito.
Dizendo-se um pragmático em defesa do Rio, Paes conta ter optado por um vice cujo partido, o PL, não tem candidato ao Palácio do Planalto para evitar que a disputa presidencial venha a contaminar sua candidatura.
“Sou um pragmático. Quero resolver os problemas da cidade. Bolsonaro é o presidente e vai ter um parceiro no Rio”, diz o ex-prefeito, lembrando que Crivella foi ministro do Governo de Dilma Rousseff.
No Rio, fracassou a tentativa de lançamento de uma candidatura única de partidos de esquerda. Lançada pelo PT, a ex-governadora Benedita da Silva afirma haver “espaço para uma candidatura do povo no segundo turno”, mesmo na cidade onde Bolsonaro construiu sua trajetória política.
“O Rio é o domicílio do Bolsonaro, mas também é o meu domicílio eleitoral e foi domicílio de grandes brasileiros que lutaram contra o fascismo que Bolsonaro representa. Daqui saíram muitos pracinhas para lutar na Segunda Guerra contra o fascismo, inclusive. Os verdadeiros patriotas sabem disso”, afirma.
Pelo PSOL, a deputada Renata Souza se apresenta como candidata da maior força de esquerda no Rio.
Sem citar alianças passadas do PT, ela afirma que o distanciamento da base Garotinho, Cabral, Crivella e Eduardo Paes permitiu ao PSOL “abrir o debate galgado na participação de movimentos urbanos e da sociedade organizada”.
“Não só há espaço para candidatura de esquerda na cidade que gestou o bolsonarismo, como temos a responsabilidade de construir aqui a principal força de oposição ao que este grupo representa: intolerância, ódio, esquemas de vantagem pessoal e negacionismo. Uma velha política que se traveste de nova mas, na realidade, representa mais violência e desigualdade”.
Filha dos ex-governadores Anthony e Rosinha Matheus, a deputada federal Clarissa Garotinho (PROS) afirma que o Rio precisa de um prefeito com capacidade de diálogo com o presidente. “O Rio já sofreu demais com essa falta de diálogo. Me coloco como uma opção de centro. Crivella é um falso bolsonarista. Foi ministro do PT.”
Candidato do PSL, o deputado federal Luiz Lima também busca atrair o eleitor de Bolsonaro. O ex-nadador olímpico afirma defender o presidente “com unhas e dentes” e que espera contar com a confiança de Bolsonaro na eleição. Ele diz também ser notório o impacto das operações sobre as candidaturas de Crivella e Paes.
Lima trabalha para reconquistar o apoio do presidente depois de ter abandonado o projeto da família de criação de um novo partido, o Aliança. Flávio Bolsonaro já avisou, no entanto, que não será permitido a ele o uso da imagem do pai durante a campanha. “Estou muito seguro de estar defendendo o presidente Jair Messias Bolsonaro aqui no município do Rio.”
A necessidade de montagem de palanques municipais com vistas às eleições de 2022 pesou para a frustração de uma aliança entre os partidos de centro-esquerda.
O PDT, de Ciro Gomes, aposta na candidatura da deputada estadual e delegada aposentada Martha Rocha para a Prefeitura do Rio. A Rede de Sustentabilidade, de Marina Silva, lançou o ex-presidente do Flamengo Eduardo Bandeira de Mello.
Dizendo-se progressista, ele afirma que a dicotomia esquerda-direita está ultrapassada. Segundo ele, o futuro prefeito terá que ter uma relação institucional adequada com os governos estadual e federal.
Candidato do Partido Novo, o empresário Fred Luz minimiza a influência das disputas nacionais sobre a corrida pela prefeitura do Rio. Ele defende diálogo do eleito com o presidente da República. “Não é conversa de amiguinho. Mas voltada para o Rio”.