O momento em que Peter Parker é picado por uma aranha radioativa, ou a fuga espetacular do Superman antes que Krypton exploda: a origem, o início de tudo, é algo que sempre fascinou os fãs das histórias em quadrinhos.
Não é estranho, portanto, que os 135 mil inscritos na Comic-Con de San Diego 2019, que começa nesta semana, queiram saber como foi o início humilde desse evento que hoje é a maior celebração da cultura pop do planeta.
A convenção agora atrai importantes nomes de Hollywood e para este ano estão previstas as presenças de Arnold Schwarzenegger, Patrick Stewart e o elenco da série “Game of Thrones” nos esperados painéis do evento. Eles servem de vitrine para as mais lucrativas franquias das HQs, cinema e televisão.
Mas a primeira convenção – ideia de um colecionador de quadrinhos de 36 anos, desempregado, e de seus cinco amigos adolescentes – reuniu apenas algumas dezenas de pessoas no subsolo de um hotel barato em março de 1970.
A “Golden State Comic-Con” foi o primeiro encontro concebido para conectar os fãs para que eles pudessem conhecer seus heróis – os criadores dos quadrinhos – quando o gênero ainda estava a anos-luz de ser a galinha dos ovos de ouro da indústria do entretenimento.
“Nunca achamos que seríamos tão grandes como somos agora, nunca pensamos que estaríamos aqui 50 anos depois”, conta o diretor de marketing da Comic-Con, David Glanzer. “Eles foram as primeiras pessoas que realmente entendiam os quadrinhos como uma arte.”
De Capra a Tarantino
O crescimento da Comic-Con foi gradual, mas implacável. Com o passar dos anos, transcendeu as histórias em quadrinhos, o cinema e a televisão, concentrando-se em gêneros como fantasia e ficção científica.
Vencedor de três Oscars, o renomado diretor Frank Capra foi o primeiro grande nome a participar do evento.
Chris Hemsworth, o Thor, dá um mata-leão em Chris Evans, o Capitão América, em evento de ‘Os Vingadores 2: A Era de Ultron’ na Comic-Con 2014, em San Diego — Foto: Mario Anzuoni/Reuters
Nos anos 1970, o nascimento do movimento trekker, os fãs de Star Trek (Jornada nas Estrelas) e suas convenções ajudaram a pavimentar eventos que reuniam atores, artistas e admiradores dispostos a comprar itens até então artesanais e participar de concursos de fantasias de seus personagens favoritos, os cosplay.
Pode-se dizer o divisor de águas do fenômeno ocorreu em 1976, “quando um publicitário da Lucasfilm enviou cartazes e outros itens para promover um “pequeno filme chamado Star Wars”, comenta Glanzer.
A tática de promoção do “boca a boca” da obra de capa e espada espacial de George Lucas foi “o marketing viral antes de que existisse o próprio marketing viral”, acrescenta.
Visão geral do centro de convenções de San Diego, na Califórnia (EUA) preparado para a Comic-Con 2018 — Foto: JOE SCARNICI / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / AFP
Importantes executivos, que antes viam o evento como uma mera diversão de fim de semana, passaram a frequentar a festa a fim de fechar contratos importantíssimos.
Na década de 1990, estúdios e redes de televisão começaram a enviar seus astros e diretores, obrigando a imprensa tradicional a prestar atenção em seus produtos.
O diretor Francis Ford Coppola compareceu para promover “Drácula”, enquanto que Quentin Tarantino passou de simples fã a convidado especial dos painéis.
“Antes costumávamos distribuir entre 2.000 e 3.000 entradas à imprensa, porque as pessoas não queriam vir”, recorda Glanzer. “Agora, as entradas são vendidas em menos de uma hora”, completou.
Raízes dos comics
A receita é tão bem-sucedida que outras Comic-Cons começaram a ser realizadas em todo planeta: de Nova York à Arábia Saudita, passando pela CCXP no Brasil, que já é maior evento em número de público no mundo inteiro.
Este ano, o Centro de Convenção de San Diego vai receber uma série de painéis que farão uma viagem no tempo para celebrar o início da Comic-Con.
Johnny Depp, Aaron Paul, Gal Gadot, Andrew Lincoln e Jason Momoa foram destaques da Comic-Con 2018 em San Diego — Foto: AP e Reuters
Muito serão tomados de nostalgia, pois todo esse crescimento tem um custo. O que era um evento íntimo, para verdadeiros fãs, agora recebe milhares de pessoas, muitas atraídas mais pelo modismo do que pela paixão. A ampliação do público torna tudo mais complicado: das longas filas aos corredores abarrotados.
Os pequenos lojistas de quadrinhos, que, por décadas, tiveram seu lugar no evento, agora não podem participar devido aos altos custos. Muitos lamentam que, em meio aos sucessos de Hollywood e dos videogames, os quadrinhos tenham ficado de lado.
“Nunca se tratou apenas de quadrinhos”, rebate Glanzer. “Claro que recebemos muita gente de Hollywood, mas o entretenimento hoje é diferente do de 1970. Acho que é simplesmente uma evolução saudável e uma valorização da arte em suas distintas formas.”
“Enquanto mantivermos nossas raízes nos comics e oferecermos outras expressões artísticas, acho que estamos no caminho certo.”
Fonte: G1
Foto: Mike Blake/Reuters