Por Daniela Degani
Há 90 dias, uma nova palavra surgiu no vocabulário do mundo:
coronavírus. Para muitos, ela apareceu como sinônimo de preocupação e
pânico. Mas, a verdade é que de nada adianta “entrar em pânico”,
porque esta é apenas mais uma situação complexa que precisa ser
encarada. E, nesse caso, quanto mais lucidez e bom senso, melhor.
Se olharmos pela janela, as ruas estão mais vazias. Aulas suspensas
para as crianças. Quem pode, está em home office. Algo que começou do
outro lado do mundo impacta diretamente nosso dia a dia. Parece o
cenário daquela velha canção: “o dia em que a Terra parou”.
Mas, na verdade, ela continua girando como sempre, no mesmo ritmo.
Quem teve de parar fomos nós. E, em vez de lamentar, temos a
oportunidade de olhar para um outro prisma desta situação. A correria
do dia a dia parecia interminável? Agora, o ritmo é mais lento, e
ganhamos de presente mais tempo, para alguns o bem mais precioso e
luxuoso da sociedade contemporânea.
Claro que é difícil encontrar equilíbrio em tempos tão desafiadores. O
caos refletido nas notícias nos afeta e agora elas chegam pela TV,
pelo computador, pelo celular… Lidar com esse cenário exige mudanças
em nossa postura diária.
Se às vezes as reuniões de família eram sinônimo de pessoas isoladas
olhando para uma tela de celular, agora somos obrigados a olhar-nos
nos olhos, porque estaremos o tempo todo “confinados” em nossas casas,
sem poder “fugir” para ambientes maiores e círculos sociais mais
amplos. Mas, a melhor parte disso é que este “confinamento” acontece
no mesmo ambiente em que estão as pessoas que mais amamos, e a quem
escolhemos para serem nossos laços mais íntimos.
Nesse momento em que precisamos focar em coisas simples como lavar bem
as mãos, a palavra “empatia” tem sido usada por diversas autoridades,
dos mais variados países: precisamos pensar nos outros, para não
contaminar quem pode estar mais suscetível; precisamos cuidar do todo
para diminuir o nosso próprio risco.
Essa inversão é uma linda chance para que, de fato, passemos a olhar
para o outro, suas necessidades e dificuldades. É uma oportunidade
para voltarmos a conversar, para estabelecermos uma relação mais
harmoniosa com as pessoas. Para exercitar a escuta atenta, para
retomarmos relacionamentos que haviam sido comprometidos por opiniões
diferentes e pontos de vista discordantes.
Como afirma Oren Jay Sofer, professor de mindfulness, meditação e
comunicação não violenta: “É possível conversarmos sobre estes
assuntos (política, religião, saúde) sem prejudicar relacionamentos.
Ao invés de culpar, julgar ou rotular, podemos falar de coração, sobre
como nos sentimos em relação a determinados assuntos e o porquê. Dizer
que gostaria que todos fossem tratados com respeito, não importa cor,
nacionalidade, sexo ou religião…”. Para ele, a questão é tentar olhar
para além de si mesmo. “Quando permanecemos com nossos próprios
sentimentos, em vez de tentar imputá-los a outras pessoas, podemos
minimizar conflitos”.
Podemos aproveitar o momento para voltar a olhar com mais calma para o
outro. Um outro muito próximo, que mora na mesma casa, que faz as
refeições ao nosso lado. Podemos investir em dialogar mais, em brincar
com as crianças, em apenas passar o tempo e aprender com nossa
família. E, o mais importante, não deixar o medo tomar conta, agindo
de forma lúcida.
Nesse aspecto, mindfulness nos ajuda a criar espaços, “olhar fora da
caixinha” sem nos fecharmos em nosso próprios problemas. Se nos
fechamos em um problema, as nossas reações neurológicas fazem com que
não possamos ver outras possibilidades, mas quando damos um passo para
trás, conseguimos ver este espaço, e nele enxergar o que há de
positivo. Isso tem a ver com não se fixar numa postura muito estreita
de mente e também com enxergar o lado bom das coisas.
*Daniela Degani é especialista em meditação mindfulness, certificada
pelo Mindfulness Training Institute da Inglaterra, e idealizadora da
MindKids.