O peso dos tributos, a reforma tributária e ICMS em Mato Grosso

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Por Gisele Silvente* |Desde a promulgação da atual Constituição Federal em 1988, foram editadas 6.475.682 (seis milhões, quatrocentos e setenta e cinco mil, seiscentos e oitenta e duas) normas, representando uma média de 554 normas editadas todos os dias ou 800 normas editadas por dia útil. Desse total de 6.475.682 normas gerais editadas, 419.387 são normas tributárias editadas, sendo, 32.104 normas tributárias federais, 138.042 normas tributárias estaduais e 249.241 normas tributárias municipais, (IBPT). Gerando, assim, uma média de 52 normas tributárias/dia útil ou 2,17 normas por hora/útil. 

Nesse contexto se encontra enraizada a definição de que o sistema tributário brasileiro é muito complexo, representando enorme desafio aos contribuintes e profissionais para assimilar de maneira correta e tempestiva a forma de calcular os impostos devidos, já que atualmente existem noventa e dois tributos vigentes.

Além do elevado número de modalidades de tributos existentes ressalta-se, ainda, sua elevada carga. A combinação dessas duas variáveis, dentre outras, cria um ambiente desfavorável aos negócios, que, recorrentemente, tem encarecido o produto nacional, bem como tem afugentado investidores.

Segundo a ABIMAQ (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos), um bom sistema tributário deve ser baseado em cinco pilares, sendo: 1) Justiça: modelo mais igualitário para todos; 2) Simplificação: facilitar o cálculo e o pagamento dos tributos devidos; 3) Neutralidade: reduzir os regimes especiais e tornar a produção mais eficiente; 4) Equidade: equilibrar nacionalmente as cargas tributárias entre diferentes setores, estados e municípios e 5) Transparência: para que todos saibam quantos impostos estão pagando.

Nessa perspectiva, encontra-se em discussão uma reforma tributária no Brasil, mas vale ressaltar que o processo já foi iniciado com problemas, já que existem duas propostas de emendas constitucionais em discussão, sendo a PEC 45/2019, proposta pela Câmara dos Deputados e a PEC 110/2019. pelo Senado Federal. A primeira propõe a extinção de 5 tributos: IPI, PIS, COFINS, ICMS e ISS, já a segunda traz como proposta  extinguir 9 tributos: IPI, IOF, PIS, Pasep, COFINS, CIDE Combustíveis, Salário-Educação, ICMS, ISS. E ambas propõem a criação do IBS – Imposto sobre bens e serviços, em substituição aos tributos extintos.

A Câmara dos Deputados defende a criação de uma alíquota formada pela soma do percentual atribuído pela União, Estados e Municípios. Dessa forma esta alíquota não seria uniforme, tendo em vista que Estados e Municípios poderão fixar suas alíquotas. Do Senado Federal surge a proposta da criação de uma alíquota padrão, mas poderão existir alíquotas diferenciadas (benefícios), que serão aplicadas de forma uniforme em todo País.

Em meio a uma discussão que já nasceu conturbada face a existência de duas propostas similares, o Poder Executivo Federal cria o Projeto de Lei N. 3887/2020 propondo a substituição de 5 tributos: PIS/Pasep sobre a receita, folha de salários e importação, COFINS e COFINS importação, pela criação da CBS – Contribuição Social sobre operações com bens e serviços, com uma alíquota única e não cumulativa de 12% (doze por cento) para empresas em geral e importadores e 5,8% para instituições financeiras, planos de saúde e seguradoras. A que se notar que os tributos que seriam extintos pelos duas PEC´s encontram-se citados no PL N. 3887/2020, ou seja, mais uma medida atrapalhada do governo.

Atualmente, a nível federal, os contribuintes, em regra geral, estão sujeitos a recolher mensalmente e/ou trimestralmente quatro tributos: IRPJ, CSLL, COFINS e PIS/PASEP. Para apuração desses tributos, encontram-se em vigência, quatro regimes: lucro presumido, lucro real, lucro arbitrado e simples nacional.

Por exemplo, uma empresa comercial/industrial optante pelo lucro presumido está sujeita a uma carga tributária média de 5,93% (cinco vírgula noventa e três por centos) sobre o faturamento, englobando o IRPJ, CSLL, COFINS e PIS/PASEP, sem contar o ICMS e o IPI. E as prestadoras de serviços 16,33%, levando-se em consideração uma alíquota do ISSQN de 5% (cinco por cento).

Agora se o contribuinte trabalhar com o  lucro real essa carga passa a ser de 24% (vinte  quatro por cento) sobre o lucro efetivo ajustado a título de IRPJ e CSLL mais 1,65% para o Pis/Pasep e 7,6% para a Cofins, aplicável tanto sobre as saídas quanto às entradas.

Ressaltam-se dois pontos importantes, o primeiro é que a reforma tributária proposta pelas PEC´s e pela PL 3887/2020 não alcança as empresas optantes pelo simples nacional, pois continuariam recolhendo os tributos nos termos da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006 e o segundo é não está sendo levado em consideração. São claros os outros tributos a que os contribuintes estão sujeitos, como por exemplo, IPVA, alvará da prefeitura e outras taxas legais.

Em todo esse contexto, não podemos nos furtar de comentar que no Estado de Mato Grosso(MT) tivemos uma “mini reforma tributária” no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no ano de 2019, com base na Lei Complementar n. 631/2019, que passou a vigorar a partir de 01/01/2020.

Desde 04/2003 os contribuintes de MT recolhiam o ICMS por metodologias denominadas “regimes de antecipação”, sendo: ICMS Garantido Integral, ICMS Estimativa por Operação, ICMS Estimativa Simplificado (Carga Média), ICMS 10,15%, ICMS 7,5%, ICMS 8,10% e ICMS 15%. 

Esses regimes de antecipação foram revogados pela LC 631/2019 e, em janeiro de 2020, entraram em vigor novas formas para apuração e cálculo do ICMS em Mato Grosso, que passaram a ser compostas de quatro métodos: o primeiro, o ICMS Apuração Normal, apurado mensalmente e incidente sobre mercadorias que não estão sujeitas ao recolhimento do ICMS antecipado; o segundo é ICMS Substituição Tributária, onde o recolhimento deve ser realizado antecipadamente à entrada da mercadoria em MT, o terceiro, o ICMS Diferencial de Alíquotas(Difal Entrada) incidente sobre a aquisição de material de uso/consumo/imobilizado de outras unidades federadas e o quarto e último é o ICMS Diferencial de Alíquotas (Difal Saída) incidente sobre as operações interestaduais com destino a consumidor final e não contribuinte do ICMS.

Para cálculo do ICMS, a principal alíquota incidente nas operações internas é de 17% (dezessete por cento) e nas operações interestaduais é de 12% (doze por cento), mas há outros produtos que internamente à alíquota são maior como por exemplo, 18% (dezoito por cento) para cerveja e chope produzidos por empresa classificada como microcervejaria artesanal, 25% (vinte e cinco por cento) nas operações com álcool carburante, gasolina e querosene de aviação, com bebidas alcoólicas, com cervejas e chopes, com joias, com embarcações de esporte e de recreação e com cosméticos e perfumes, 30% (trinta por cento) para serviços de comunicação e 35% (trinta e cinco por cento) para armas e munições e cigarro, fumo e seus derivados.

Portanto, os contribuintes de MT passaram e continuam envoltos por período de intensa adaptação para atender às novas metodologias para apuração do ICMS, pois esse processo não se limita a simplesmente alterar a fórmula do cálculo do imposto, mas é composto por conjunto de ações e, principalmente, gastos que culminam na alteração da forma de se apurar o ICMS. 

A primeira ação é a de proporcionar a qualificação dos profissionais acerca das novas regras vigentes e a segunda ação se refere às adequações nos ferramentais tecnológicos utilizados pelas empresas, desde a emissão do documento fiscal (NFe, NFCe, CTe, etc), sua escrituração fiscal, a apuração do ICMS e pôr fim a entrega das declarações fiscais (SPED Fiscal e DESTDA) para o fisco; consolidando todo o processo tributário.

Para a realização de todos esses ajustes e adaptações os contribuintes tiveram que fazer face a inúmeros desembolsos em um curto espaço de tempo, já que a Lei Complementar N. 631/2019 é de 31/07/2019  passou a vigorar cinco meses depois, ou seja 01/01/2020.

A que se considerar, ainda, que com os enormes gastos efetuados nesse processo de adequação às novas normas vigentes, fomos assolados pela pandemia Covid 19 que afetou drasticamente de maneira negativa a vida das empresas. E, assim, diante de todo esse contexto, os contribuintes permanecem envolvidos em um emaranhado de discussões tributárias e na incerteza de qual proposta realmente lhe será benéfica.

Especificamente em MT os contribuintes acabaram de passar por uma expressiva mudança no ICMS e a implantação de novas medidas tributárias acarretará mais um período de intenso desembolso para o cumprimento dos novos dispositivos legais.

A Reforma Tributária é um assunto complexo do ponto de vista técnico e, principalmente, político, já que o sistema tributário define o tamanho da carga tributária e como essa carga será distribuída entre os grupos de renda e setores da economia. Dessa forma, ainda há muito a refletir acerca de qual seria o sistema tributário mais adequado, diga-se justo para os contribuintes desse nosso imenso Brasil.

Ressalta-se, portanto, que todos, contribuintes e consumidores se encontram temerosos que ocorra um aumento da carga tributária. Como a tributação sobre o consumo está embutida nos preços dos bens e serviços, a reforma tende a afetar também os preços relativos em função do efeito sobre os diferentes setores da economia; impactando, também, os consumidores.

* Giseli Silvente é doutora em administração e consultora tributária com foco em ICMS em Cuiabá-MT – Instagram: @profgiselisilvente

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