Mais de 850 milhões de meninas e mulheres vivem em países classificados como “muito pobres” em igualdade de gênero, segundo relatório publicado recentemente pela coalização de organizações internacionais Equal Measures 2030. Entre as violações de direitos humanos apontadas estão restrições, abusos — incluindo gravidez forçada — casamento na infância, fome, proibição de estudo.
O documento traz um detalhado estudo de como estariam as perspectivas para que o mundo atingisse a meta da Agenda 2030, compromisso firmado entre 193 Estados-membro da ONU em setembro de 2015 incluindo o Brasil, com diversos objetivos, inclusive a diminuição das desigualdades de gênero.
A conclusão não é muito animadora: uma menina nascida hoje teria que esperar até seu 97º aniversário para comemorar uma sociedade igualitária. E entre 2019 e 2022, quase 40% dos países observados — que abrigam mais de 1 bilhão de mulheres e meninas — estagnaram ou declinaram em relação à igualdade de gênero.
O Brasil ocupa o 64º lugar no ranking e é apontado como pobre em igualdade de gênero, mas, ao contrário de outros países, está em lenta ascensão.
Alguns dos países monitorados tiveram retrocessos em seus direitos. Se nos próximos seis anos todos os países seguirem essa trajetória, mostra o documento, a pontuação em 2030 seria ainda abaixo do ponto de partida em 2015.
Conflitos armados, a aceleração do colapso climático, as campanhas anti-gênero, e as ameaças à democracia estariam atrasando ou revertendo o progresso: “Democracias em todo o mundo estão em risco devido ao aumento da desigualdade econômica, à polarização social e política e ao fechamento do espaço cívico. A ascensão de governos de direita, nacionalistas, populistas e antidemocráticos traz consigo um aumento do antifeminismo” explica o relatório.
Para dar um exemplo, um dos países em declínio é a Polônia, que agora ocupa a 29 posição. Esse retrocesso seria fruto de oito anos de um governo nacionalista conservador, que introduziu uma proibição quase total do aborto em 2021 — com amplo apoio do ex-ministério de Damares Alves, diga-se de passagem — e que tem uma organização de extrema direita fundada a partir da TFP Brasileira, a Ordo Iuris, como uma das principais influências políticas.
Em entrevista ao The Guardian, Heather Barr, diretora da divisão de direitos das mulheres da Human Rights Watch disse que o recente surgimento de governos autoritários assumindo o poder em países “que trabalham com base em um manual que reverte ganhos duramente conquistados sobre os direitos das mulheres sob o pretexto de apoiar ‘valores tradicionais” seriam responsáveis por parte desse retrocesso. Além disso, segundo ela, faltam mulheres em posições de tomada de decisão.