A comunicação pública pode unificar e difundir a “brasilidade” no mundo, além de fomentar trocas e parcerias
Por Richard Santos
O Brasil saiu da Copa do Mundo, derrotado pela Croácia, mas a seleção levou às arenas uma habilidade informal da diplomacia: o “soft power”. Esse mecanismo permite aos países influenciar preferências e comportamentos por meio da persuasão. Entre as jogadas de Richarlison, Neymar e Vini Jr., o Brasil avançou. Mas fora de campo, sob novo treinador e nova comissão técnica, é preciso fazer gols por meio do “poder suave” da comunicação pública.
A retomada da TV Brasil e da TV Brasil Internacional abrem um leque de oportunidades para o novo governo, muito além do audiovisual. A reconstrução da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) deve ser parte da restauração da imagem do Brasil dentro e fora do país tal qual da camisa 10.
Criada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2008, a EBC organizou e amplificou o sistema de radiodifusão pública no país (posteriormente, usado ilegalmente por Jair Bolsonaro para difundir desinformação e fazer proselitismo político e religioso).
Agora, ao traçar o futuro, é preciso considerar o potencial da estatal de difundir a brasilidade através de produções audiovisuais e jornalísticas que possam ser exportadas, além de fortalecer a rede nacional de comunicação pública (incluindo emissoras estaduais e universitárias) mais parcerias com nações amigas.
Os países de língua oficial portuguesa (PALOPs), já sinalizaram a intenção de se aproximar do Brasil, por exemplo, fartos que estão dos conteúdos vindos do continente europeu. A intenção deve ser também a de fomento, por meio de editais para coproduções.
Em território nacional, a nova comissão técnica precisa dessa compreensão.
Uma nova proposta que resgate a EBC dos porões aos quais o governo que se despede a relegou e a reemposse à estatura de sua missão constitucional, é uma proposta que terá que relocá-la no campo da Cultura, compreendendo que a comunicação pública é a principal responsável pela construção, manutenção e promoção do que chamamos de imaginário e que deve refletir verdadeiramente o povo e remeter à soberania nacional.
A retomada da EBC em novo patamar é ainda o condão capaz de atuar como um contrapeso às empresas midiático-corporativas nacionais e internacionais.
A exposição mais franca e aberta sobre o potencial da EBC é algo possível de ser identificado no histórico da economia política da comunicação nacional. Porém, entre o campo público progressista, conforme apontado pelo livro “Branquitude e Televisão”, as políticas do audiovisual raramente rompem com as oligarquias.
Esse quadro não é exclusividade do Brasil.
É inerente ao processo histórico latino-americano, onde há grande dificuldade, mesmo da esquerda, em romper com as amarras coloniais. Governos seguem reproduzindo políticas que beneficiam os mesmos grupos. O resultado são conteúdos gerados para uma massa que pouco se vê nas telas, gerando desconexão. Ou seja, mudança pura e simples de canal.
Precisamos romper com essa paralisia e oxigenar a mídia pública. Sabemos dos desafios de uma frente ampla e receamos. A necessidade de pluralidade somente será refletida na grade das emissoras públicas se nascida de uma direção também plural.
Neste hiato entre um não governo, é preciso que a sociedade interaja com os novos governantes, e que estes tenham escuta ativa. Precisamos provocar reflexão sobre o papel da EBC para além de sua retomada aos princípios originais.
Planejar estrategicamente a empresa para a contemporaneidade, onde o metaverso é uma realidade, é pensá-la como ativo cultural para a unificação do país e para descolonização. Ou seja, esta bola, a do “soft power”, está aos nossos pés.
*Richard Santos, também conhecido como Big Richard, é professor da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) e doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Brasília (UNB).
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Fonte: Brasil de Fato