Fé, resistência e tradição: o legado negro nas igrejas de Cuiabá

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A Igreja do Rosário e São Benedito, localizada no Morro da Luz, é um dos maiores símbolos dessa fé

“São Benedito, o seu manto cheira, cheira a cravo e rosa, cheira a flor de laranjeira.” Esses versos ecoam a devoção de um povo cuja fé está profundamente enraizada na rotina e na tradição do cuiabano. A Igreja do Rosário e São Benedito, localizada no Morro da Luz, é um dos maiores símbolos dessa fé. Com mais de 300 anos de história, o templo é um cartão postal de Cuiabá.

“Normalmente, só os padres poderiam ter acesso a esse lugar. A cada degrau que se aproxima desse local sagrado, mais importante você era dentro dessa comunidade.” explicou o historiador Suelme Fernandes.

Construída em 1722, a igreja preserva características originais, como o altar em talha dourada, e foi tombada pelo Patrimônio Histórico em 1975. Suas paredes de taipa de pilão resistiram ao tempo, passando por reformas que restauraram sua arquitetura colonial. Das igrejas históricas erguidas após o descobrimento de Cuiabá, a Igreja do Rosário e São Benedito é a única que permanece intacta, mantendo viva a memória de sua construção feita por mãos negras.

“Ou você participava da associação da comunidade, da irmandade dos negros de Cuiabá, ou tinha algum poder econômico aqui. Estar perto do sagrado era algo para poucos.”. Destacou Suelme Fernandes.

A igreja, dedicada a São Benedito, segue fechada para reformas, mas sua história de resistência persiste.

Segundo o padre Canisio Schroeder, há desafios no processo de restauração. “Ela continua fechada, sem nenhuma iniciativa de trabalho para começar as atividades. Houve uma promessa do Governo do Estado em 2023 para repassar recursos ao arquiteto responsável pelo projeto, mas como isso não aconteceu, decidimos pela paróquia dar continuidade ao processo para apresentar o projeto ao IPHAM”.

Outro exemplo do legado negro em Cuiabá é a Igreja da Boa-Morte, inaugurada em 1810. Com registros da Irmandade de 190 membros em 1826, o espaço reflete a espiritualidade e união do povo negro. Para o historiador João Carlos Vicente Ferreira, a igreja simboliza a luta por identidade e fé. “A Igreja da Boa-Morte foi construída única e exclusivamente para abrigar a fé dos negros, que lutavam por suas prerrogativas e identidades. Suas festas memoráveis rivalizavam até mesmo com a Catedral Senhor Bom Jesus de Cuiabá”.

Esses templos, erguidos com suor e devoção, são mais que construções religiosas: são marcos da resistência, da fé e da rica contribuição do povo negro na construção da história de Cuiabá.

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