Por Edilson Serra* |Com a polarização política ocorrida nos últimos anos, várias entidades se viram repentinamente no bojo de discussões acerca de sua possível orientação político-ideológica. Inúmeras instituições sofrem com essa classificação. Vejamos alguns jornais que até pouco tempo eram tachados como de direita agora sendo chamados de “comunistas”. Mas nosso interesse aqui é tratar da universidade, dos institutos federais e, finalmente, das escolas públicas. No que diz respeito à ideologia política, elas são de esquerda ou de direita?
À parte todos os discursos que tentam se apropriar da Educação – os sindicatos, os partidos políticos, as diversas agremiações sociais que se esforçam continuamente para legitimar seu discurso no território do saber que a escola emana – ela não é de direita ou esquerda. A escola, lugar de Ciência, não se assenta em ideologias político-partidárias. Sua vertente é a crítico-social.
As universidades do Brasil e do mundo são, em sua maioria, centros de pesquisa científica. Por sua vez, a Ciência se assenta em uma premissa basilar: a tentativa diária de romper com as verdades estabelecidas, ainda que essas verdades seja ela mesma quem tenha criado.
Vamos a um exemplo, a Ciência criou o telefone no final do século XIX. Criado o telefone, a Ciência não quer mais o telefone. Ela o solta na rua (no mercado, enfim, disponibiliza-o para a sociedade) e continua as pesquisas “criticando” o telefone no sentido de encontrar falhas, defeitos ou mesmo de superá-lo totalmente.
Ora, nessa sequência, chegamos historicamente aos smartphones de hoje. E pensa que a ciência está feliz com a super tecnologia que temos? Que nada, o papel dela é “reclamar” dos smartphones, encontrar seus defeitos – a duração da bateria é um problema amplamente estudado – e mais, o desejo da Ciência é superá-lo totalmente. Enquanto não consegue dar esse salto, vai modificando o aparelho pelo menos um pouquinho a cada lançamento.
A Ciência também faz o mesmo no campo das ideias. Elabora o tempo todo novas ideias que muitas vezes até contradizem a anterior. E não há problema nisso. A preocupação da Ciência e, por conseguinte, das universidades, institutos federais e outros centros de pesquisas, inclusive escolas, não é ficar reproduzindo interminavelmente o produto (seja ele material ou imaterial, como as ideias).
O papel de reprodução cabe às fábricas. Como lugar de Ciência, a universidade e mesmo a escola onde estudamos, que é um lugar eminentemente de divulgação do saber científico, deseja o homem livre e questionador, a fim de superar a si mesmo e o mundo que o envolve.
Nesse bojo, muitas vezes as instituições de ensino são vistas como de esquerda, pois não aceitam nada que soe limitador ou conservador, questionando sempre o status quo, os lugares estabelecidos. Como parte da direita política tem um viés de manutenção, de conservação de determinadas realidades, acaba entrando em conflito com as ideias que circulam nas instituições de ensino e pesquisa. Por outro lado, o mesmo ocorre com a esquerda. Não são poucas as vezes que esta tenta se apropriar dos discursos críticos da Ciência, mas os abandonam na medida em que contrariam suas teses.
A Ciência luta para se manter apegada aos fatos científicos e essa é toda a sua verdade. Sua ideologia é construir um futuro melhor que a realidade vivida.
A escola, mesmo a primária, é o lugar do salto para fora de si e do pequeno mundo no qual se vive. É o espaço próprio da revolução, ainda que só na esfera individual. Não é à toa que logo nos primeiros anos de aula a criança, apegada à novas verdades que aprendeu na escola, começa a questionar os pais em casa. E colocamos nossos filhos lá para isso mesmo. Todo processo de transformação passa pelo momento da crítica, velada ou exposta.
Posto isso, como lugar de feitura ou apropriações de Ciências, a escola não é de direita ou de esquerda. Sua vertente é a crítico-social, doa a quem doer.
*Edilson Serra é doutor em Literatura (UFRN), professor efetivo no IFMT e coordenador da área de Linguagens e Códigos. ([email protected])