A Gestão do Conto de Fadas

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Cleber recebia pelo sexto ano consecutivo o belo convite – sua empresa estava a ser premiada como a loja de maior referência para os clientes da região.

Dono de uma rede de lojas de eletrodomésticos estava diante de um grande impasse.

Sensação de gratidão, mas também de peso em suas costas. Tinha algumas informações na mão e precisava decidir:

Qual caminho seguir? Qual rumo tomar em relação a sua maior loja, a matriz?

Ele tinha resultados. Mas junto deste também muitas queixas dos funcionários, rotatividade da equipe e claramente um clima pesado, em sua maior loja, a de maior expressão do grupo de 8 que comandava.

Seu gerente Dantas, um dos mais antigos do grupo, o grande imperador assim chamado nos corredores, parceiro e braço direito de Cleber era também o “carrasco” segundo a equipe. Com pouca liderança e muita atitude de chefe, era comum quando insatisfeito soltar seus gritos pelo salão, chamando atenção de um ou outro. Afinal ele não sabia lidar quando as coisas saiam do seu controle, não admitia cliente insatisfeito. Sua gestão de resultados era pautada em ameaças e medo, essa era a forma que ele acreditava que conseguia controlar a situação.

“Cara, ou você segue o que eu estou dizendo, ou você vai pra rua!”

Frases como essa eram comuns.

A sorte de Dantas é que neste cenário que se repetia principalmente na segunda quinzena do mês, ele tinha Jeferson, ou popularmente chamado, Jefinho, seu subgerente, responsável pela área administrativa da loja, a quem Dantas estranhamente parecia respeitar.

Jefinho era o abrandador, era o equilíbrio dali.

Nos últimos dias do mês, período em que Dantas ficava muito pressionado para superar as metas de sua loja, Jefinho saia da sua sala e equalizava.

A pressão de Dantas, era transformada em motivação por Jeferson, que tirava o foco da equipe que estava na raiva de Dantas em compreensão.

“Relaxem, não é com vocês.  É com ele. É pressão. Filtrem!”

Assim ia fazendo seus pequenos ajustes necessários, conseguindo com que aquela energia fosse transformada em força, em motivação canalizada para o atendimento ao cliente. Tirando o foco da tensão de Dantas para o que tinha que ser feito.

Após uma pesquisa de clima, ferramenta utilizada para medir a satisfação dos funcionários e como esta a empresa através da ótica dos mesmos, a consultoria foi taxativa:

O seu problema na loja 02 se chama Dantas. A equipe sofre com sua forma de conduzir o time, está desmotivada.

Jeferson é quem conduz a equipe, que abranda, não fosse ele você não  teria os resultados que tem. Esse que não aparece é o grande responsável pelos resultados.

Será? – indagava Cleber que ao mesmo tempo questionava-se como não havia percebido que a situação havia chegado nesse ponto.

Sempre soube que Dantas era um gestor firme, mais durão do que os outros, e até achava que esse era o seu grande diferencial. Mas não a esse ponto.

Cleber seguiu as orientações da consultoria. Após muito pensar, muita conta, considerando a rotatividade, a desmotivação e o duro relatório após a Pesquisa de Clima, talvez realmente aquele gestor que tinha uma alta representação na folha de pagamento da empresa, na verdade somente estivesse na aba de Jeferson, o famoso Jefinho da equipe. Talvez não se tratava de Dantas, de repente o verdadeiro gestor não era ele.

Vamos eliminar o problema. Dantas foi demitido. Muitas vezes na empresa toma-se muitas decisões dessa forma: Corta!

O problema é…

Isso ocorre por causa de…

E de repente aquilo que você julgava ser uma variável determinante para a situação x, y ou z, na verdade era somente mais uma variável dentre tantas outras que influenciam o resultado final.

A gente tem a tendência de julgar assim, sendo que na verdade as situações da vida são sistêmicas, complexas. Tende-se a acreditar como sempre digo, nas soluções mágicas, que sempre haverá um responsável, um vilão, o carinha mal do lugar, o responsável de puxar tudo para baixo.

Sendo que na verdade, como estamos exemplificando nesta situação, mesmo naquele caos aparente, esta era a forma que aquele sistema havia encontrado para se equilibrar.

Isto se mostra na história de Cleber, Dantas, Jeferson e os consultores de RH.

Após 8 meses o resultado se mostrou insustentável.

Com a saída de Dantas, Jeferson assumiu a loja e a equipe.

Resumo da obra: Jeferson, um grande incentivador, porém o gestor “bonzinho” demais, sabia acolher, ouvir, ajeitar o time, mas sozinho, sem Dantas, não sabia ainda decidir, havia nele muito medo em se arriscar, dificuldades em negociar, cobrar, corrigir, em se posicionar.

No ano seguinte o famoso prêmio não veio. O baixo resultado na maior loja da rede puxou o Grupo para fora dos destaques do ano.

Nesse período Dantas foi convidado para gerenciar a loja do concorrente, também não deu certo, sem Jeferson ao seu lado não sabemos como, mas ele conseguia ser ainda mais amargo, não conseguia abrandar, equalizar, ouvir; somente cobrar, cobrar e cobrar. A equipe do concorrente desfaleceu, assim ele logo estava disponível no mercado novamente, naquele cenário pôde-se compreender porque Jeferson era tão respeitado por Dantas.

Por fim ao Jeferson também antes mesmo de completar um ano, restou o mesmo caminho da demissão.

Cleber não sabia lidar com um gestor que quando o via se escondia para não encará-lo de frente, ainda mais com aqueles resultados.

Conclusão: Naquele cenário Dantas e Jeferson se equilibravam. Mesmo na extrema imperfeição de cada um se olharmos com as lentes focadas em um só ponto. Sim, naquele cenário, naquelas condições eles se equilibravam e eram perfeitos como prótese para entregar o que tinha de ser entregue.

Só então depois de perder essa dupla incrível na entrega das metas batidas, Cleber pode compreender.

Na verdade ambos da dupla precisavam de Desenvolvimento Humano e não de uma carta de demissão.

Infelizmente essa decisão pautada no oito ou oitenta, enquadrando somente um ângulo da questão, com uma visão limitada, lhe custou muito caro.

Muito caro mesmo.

 Já vi decisões devido à lentes embasadas levarem anos para serem corrigidas e realmente representarem um prejuízo imenso a muitos empresários.

Considere o contexto, olhe vários ângulos, compreenda todos os envolvidos.

Muitas vezes não se trata de uma carta de demissão, mas de feedback, acompanhamento, supervisão, mas de Desenvolvimento Humano!

Os contos de fadas que encerram sua jornada sempre com “o felizes para sempre” nos fez acreditar que esse caminho de fumaça fosse sólido. Assim seguimos em busca dos vilões e dos heróis na vida. E essa dinâmica se estende em várias áreas inclusive nas empresas.

Eliminem os vilões! Promovam os heróis!

Na verdade a dinâmica é mais complexa, não se trata de encontrar o felizes para sempre, até porque ele não existe. Se trata de buscar os ajustes aos imperfeitos.

Nós, os imperfeitos!

A busca é individual e intransferível, mas nos como empresários, líderes podemos apresentar o caminho do desenvolvimento de habilidades aos nossos imperfeitos. A começar por nós.

Eliminem os heróis!

Eliminem os vilões das suas expectativas internas e comece a fazer gestão na vida real e não no conto de fadas.

Frustre-se se você está a procurar os vilões a serem eliminados e os heróis a serem aclamados.

Se não se tratar de quebra de valores inegociáveis, você está caminhando em uma estrada de fumaça.

 

 

Cynthia Lemos é Psicóloga Empresarial e Coach na Grandy Desenvolvimento Humano. Especialista no Desenvolvimento de Líderes e Empresas tem a missão de: Expandir a Consciência e Gerar Ações Transformadoras – para pessoas e empresas que desejam evoluir em seus projetos e objetivos. Email: [email protected]

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